Câmara mantém preso deputado Daniel Silveira (PSL-RJ)
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- Categoria: Agência DIAP
O plenário da Câmara dos Deputados aprovou, nesta sexta-feira (19), por 364 votos a favor, 130 contrários e 3 abstenções, a manutenção da prisão, aprovada de forma unanime pelo plenário do STF (Supremo Tribunal Federal), do deputado Daniel Silveira (PSL-RJ), na última quarta-feira (17), que criminosamente afrontou a Corte e seus ministros, desrespeitou o Estado Democrático de Direito, pediu o retorno do AI-5 (Ato Institucional 5) e incitou abertamente a violência contra os integrantes do Supremo. A sessão foi bastante representativa. Apenas 16 deputados faltaram.
Placar da Câmara. Manutenção da prisão de Daniel Silveira | Foto: Reprodução | TV Câmara
A relatora, deputada Magda Mofatto (PL-GO) — ao proferir o voto pela CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) —, recomendou, em seu parecer, a manutenção da prisão, considerando “gravíssimas” as acusações imputadas ao parlamentar, cujas falas teve a intenção de “intimidar os ministros do Supremo Tribunal Federal e de criar animosidade entre a Corte e as Forças Armadas.”
Em sua defesa, o deputado bolsonarista pediu desculpas pelo vídeo publicado, lançou mão da opinião de juristas contrários à prisão por conta da inviolabilidade parlamentar e fez críticas ao fato de o vídeo ter sido considerado um flagrante de delito.
O processo foi relativamente rápido. Em pouco mais de 3 horas, entre a leitura do parecer pela manutenção da prisão, a defesa do deputado, o encaminhamento do voto pelos líderes e o voto de cada deputado foi dado um recado contundente — a imunidade parlamentar não é um salvo conduto para o congressista assacar contra as instituições da democracia, como corriqueira e usualmente os seguidores de Bolsonaro têm feito.
Encaminhamento do voto
Ao encaminhar o voto da bancada do PCdoB, o líder, deputado Renildo Calheiros (PE), afirmou que os atos praticados pelo deputado Daniel Silveira não podem ser cobertos pela imunidade parlamentar ou pela liberdade de expressão.
Calheiros afirmou que o PCdoB defende as imunidades parlamentares, a separação dos poderes, a liberdade de opinião e critica o uso da Lei de Segurança Nacional. “Esses institutos não podem ser usados para desconstituir, pelos atos praticados pelo deputado, a democracia”.
Uma das falas mais esclarecedoras na sessão que manteve a prisão de Silveira foi a do deputado Fábio Trad (PSD-MS), que ao encaminhar o voto, disse: “liberdade de expressão não se confunde com permissividade para praticar o crime de extermínio da própria liberdade.”
“Isso foi o que o deputado pregou e praticou no seu pronunciamento. Liberdade de expressão tem limite, o direito à vida tem limites, tanto que a legítima defesa e o estado de necessidade excluem o caráter ilícito da conduta quando configurados os seus requisitos”, acrescentou.
“Porque a palavra é uma decisão. Dizer é um ato decisório, e a palavra no Parlamento é um ato preordenado, pensado, ainda que impulsivo, e não pode ser salvo conduto para desfiar um rosário de práticas delitivas, crimes que trafegaram por todas as avenidas, por todas as vielas do Código Penal e de leis esparsas”, finalizou.
Bolsonarismo sai derrotado
As práticas e falas do deputado que causou toda essa confusão são as mesmas que levaram Bolsonaro à Presidência da República em 2018. São, também, as práticas e falas da militância bolsonarista nas redes e nas ruas. O resultado foi uma derrota contundente ao chamado bolsonarismo raiz, como é conhecido, que desde a eleição de Bolsonaro violenta, com frequência, a democracia, o Estado Democrático de Direito e as instituições republicanas.
Ao se pronunciar favorável ao parecer da deputada Magda Mofatto, Alice Portugal (PCdoB-BA) disse que existe uma ação articulada, com ameaças reiteradas a ministros do Supremo, que entristecem e amedrontam a população. “Será que o ato é um teste para a nova Mesa Diretora e o Plenário?”, indagou.
Partidos a favor e contra a manutenção da prisão
Apenas 4 partidos encaminharam voto contra o parecer favorável da relatora: Novo, PSC, PSL e PTB. Não funcionaram as ameaças proferidas pelo pastor Silas Malafaia, líder da Assembleia de Deus, nesta quinta-feira (18), a deputados que votassem a favor da manutenção da prisão do deputado bolsonarista.
“Alerta à Frente Parlamentar Evangélica! Deputado evangélico que votar em favor dessa aberração jurídica de manter um deputado preso por suas falas, vou denunciar aos evangélicos, para nunca mais ser votado por nós. O que está em jogo é o Estado Democrático de Direito. Absurdo”, disse, no Twitter. A maioria dos deputados evangélicos preferiu não seguir a pregação do controvertido Malafaia.
Encaminharam a favor do parecer, portanto, pela manutenção da prisão do deputado, 17 partidos: PT, PL, PP, PSD, MDB, PSDB, Republicanos, DEM, PSB, PDT, Solidariedade, PSol, Avante, Cidadania, PCdoB, PV e Rede.
Liberaram as bancadas: Pros, Pode e Patriota.
Dos 51 deputados da bancada do PSL, 11 votaram pela manutenção da prisão de Daniel Silveira; e 2 estavam ausentes.
Quórum
O resultado foi inequívoco. Para ratificar a decisão do Supremo, eram necessários, pelo menos, 257 votos favoráveis (maioria absoluta) ao parecer da relatora pela CCJ, deputada Magda Mofatto. O quórum foi ultrapassado em 107 votos.
A Constituição estabelece que deputados e senadores são invioláveis, civil e penalmente, por opiniões, palavras e votos e não poderão ser presos, salvo em flagrante de crime inafiançável.
“Desculpas”, fala cortada e o voto de Bia Kicis
Na sessão, houve 2 momentos prosaicos e irônicos. O primeiro foi o deputado Daniel Silveira, conhecido por suas atitudes e falas virulentas, como as que proferiu contra o STF e seus ministros, pedindo “desculpas” aos deputados e ao povo brasileiro. “Afinou” e não sustentou o que disse no vídeo ameaçador.
O outro foi o fato de o presidente da Casa não ter permitido o deputado Kim Kataguiri (DEM-SP), que ia fazer fala a favor da manutenção da prisão e na última hora mudou de posição. Como havia uma lista de deputados que falariam, alternadamente, a favor e contra o relatório, Kataguiri teve a fala cortada para não desequilibrar a ordem das intervenções.
Por fim, registre-se o voto, contra a prisão, dado pela deputada Bia Kicis (PSL-DF), que pleiteia a presidência da CCJ. É, pode-se dizer, irônico, pois trata-se da comissão que dialoga sistematicamente com o STF e tem entre suas atribuições precípuas analisar os aspectos constitucional, legal e jurídico das proposições na Casa.
Entenda o processo de cassação
Agora, o processo aberto pela Mesa Diretora contra o deputado no Conselho de Ética, que tem reunião na próxima terça (23), vai ser analisado pelo colegiado. Desse modo, em 5 passos, entenda como vai ser o processo contra o deputado Daniel Silveira:
1) presidente instaura processo e designa relator. Como a representação foi elaborada pela Mesa Diretora, não pode ser arquivada, preliminarmente, se for considerada inepta ou sem justa causa;
2) relator notifica acusado a apresentar defesa por escrito, que tem prazo de 10 dias úteis para fazê-lo; acusado pode apresentar até 8 testemunhas;
3) apresentada defesa, relator procederá instrução no prazo improrrogável de até 40 dias úteis, tendo mais 10 dias úteis para apresentar parecer; e
4) ao final da investigação, Conselho aprova parecer, contra ou a favor de sanção.
Plenário e prazos
Se o parecer for pela suspensão (período máximo de 6 meses), ou perda do mandato, a decisão final é do plenário. Se a decisão for pela cassação do mandato são necessários os votos, de pelo menos, 257 deputados (maioria absoluta ou metade mais 1 dos 513 deputados), em votação aberta.
O prazo para deliberação do Conselho de Ética é de 60 dias úteis. O do plenário é de 90 dias úteis, contados a partir da instauração do processo no Conselho.
Pela votação desta sexta (19), é bem razoável inferir que o mandato do deputado bolsolavista — talvez o mais tosco dentre os seguidores de carteirinha de Bolsonaro e o astrólogo Olavo de Carvalho —, o mesmo que destruiu a placa em homenagem à vereadora Marielle Franco, entre outros atos de vandalismo e violência, esteja com os dias contados.
Uma mensagem clara de que a incitação à violência como forma de chantagear os poderes da República, especialmente, o Judiciário na figura de sua Corte Suprema, não tem espaço na sociedade e no Parlamento, ainda que com algumas lastimáveis exceções.