Boletim do DIAP # 305 - Março 2017
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Antônio Augusto de Queiroz*
Na democracia representativa, o eleitor é titular do poder. Quando ele delega a alguém para que, em seu nome, possa legislar, representar, alocar recursos ou administrar uma unidade da Federação, o faz com base num programa, exige prestação de contas e resultados. A alternância no poder permite que, periodicamente, um novo “delegado” ofereça ao eleitor aquilo que o antecessor não cumpriu satisfatoriamente, ou a correção de um rumo de ação que não satisfez as suas expectativas.
O representante pode exercer essa delegação, de forma legítima e plenamente, inclusive em relação a temas que tenham reflexo sobre a vida de seus eleitores, desde que a política pública objeto da deliberação tenha sido debatida na campanha eleitoral ou tenha feito parte da plataforma do candidato. Se não constou do programa nem foi discutida na campanha, mesmo assim o representante pode votar, mas será julgado por seu voto na eleição seguinte, quando irá prestar contas do mandato.
Nas eleições de 2003 a 2014 para o Congresso Nacional, além dos candidatos contarem com dinheiro fácil para gastar na campanha, por força do financiamento empresarial, o eleitor não estava ameaçado de perder direitos, e, por isso, poderia votar sem maiores preocupações.
Havia até relatos de eleitores que teriam recebido um trocado de cabos eleitorais por votarem em determinados candidatos, apesar da ilegalidade da compra de voto.
Em 2018, diferentemente, além de o candidato não poder contar com o financiamento empresarial, encontrará um eleitor que já foi vítima de redução ou supressão de direitos e, portanto, irá procurar saber como votou seu representante em relação a esses direitos, notadamente nas reformas trabalhista e previdenciária.
Ou deputados e senadores imaginam que poderão votar retirando direitos do eleitor e, mesmo assim, este continuará fiel, compreendendo suas razões, ou ignorando o que foi feito contra os seus interesses.
Do ser humano pode-se esperar tudo, inclusive que seja lesado em seus direitos e premie seu algoz com novo voto. Mas o parlamentar previdente terá, no mínimo, que refletir antes de confiar nesse julgamento benevolente ou desinformado do eleitor.
Se imagina que retirando direitos trabalhistas de alguém ou retardando a aposentadoria dessa pessoa por dez anos ou mais para ter acesso a esse direito, e, ainda assim, em valor menor do que aquele a que teria direito se não tivesse havido a reforma, o eleitor irá perdoar essa sua atitude, pode estar completamente enganado.
E, dessa vez, a agenda de reformas atinge o direito de cada cidadão, que estará muito atento ao que abala o seu órgão mais sensível: o bolso.
O parlamentar que não fizer essa reflexão antes de votar nessas reformas poderá estar colocando em risco sua sobrevivência política. Jogar a culpa nos outros, ou alegar que cumpriu ordens do seu partido, não irá colar.
Votem segundo suas consciências ou até conveniências, mas depois não reclamem de uma possível derrota política e eleitoral. Pesem prós e contras antes de votar. O julgamento será inevitável e acontecerá por ocasião da reeleição.
A renovação poderá ser maior que a tradição, se apoiarem incondicionalmente a agenda fiscal do governo.
(*) Jornalista, analista político e diretor de Documentação do Diap