A importância da regulamentação da atividade de RIG
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A atividade de RIG (relações institucionais e governamentais), reconhecida pela CBO (Classificação Brasileira de Ocupações) do Ministério do Trabalho, está em fase de regulamentação pelo Congresso Nacional, com a recente aprovação, na Câmara dos Deputados, do substitutivo ao PL (Projeto de Lei) 1.202/07, do deputado Carlos Zarattini (PT-SP), e envio ao Senado Federal em 2 de dezembro de 2022.
Antônio Augusto de Queiroz*
O objetivo da regulamentação é assegurar mais transparência e equidade na relação da sociedade e do mercado com os poderes públicos, especialmente no acesso e no exercício de influência legítima sobre autoridades dos 3 poderes, mediante apresentação de subsídios que contribuam para decisões equilibradas e com base em evidências.
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A atividade de RIG — que envolve monitoramento, articulação, defesa e representação de interesses institucionais e corporativos perante os entes públicos — deve ser exercida sempre com transparência, ética e responsividade, além de observar as boas práticas e as diretrizes constitucionais e legais na interação com os agentes públicos.
E as 2 formas de assegurar que isso ocorra com regras claras são, de um lado, a autorregulação, como já faz com filiados, a Abrig (Associados Brasileira de Relações Institucionais e Governamentais), por meio do manual “Prática Recomendada” (2020), elaborado em parceria com a ABNT (Associação Brasileira de Normas Técnicas), ou, de outro, a regulamentação em lei, como proposto no substitutivo ao PL 1.202/07, já aprovado pela Câmara dos Deputados e remetido ao Senado Federal.
O trabalho do profissional de RIG é indispensável nas democracias, porque tem como escopo promover o diálogo entre associações, empresas e instituições da sociedade civil com autoridades do Poder Público (governantes, parlamentares e altos burocratas), a fim de oferecer dados, análises e informações para que os agentes públicos decisores estejam bem informados sobre os impactos — positivos ou negativos — que as políticas públicas em debate ou em formulação possam ter sobre determinados setores, segmentos e grupos sociais específicos.
Trata-se de atividade de orientação estratégica à sociedade e ao mercado na defesa de interesses perante os agentes públicos, especialmente em relação aos 4 elementos comuns às políticas públicas:
1) o institucional (autoridade formal);
2) o decisório (escolha política);
3) o comportamental (ação ou inação); e
4) o causal (efeitos sobre o sistema político)1.
Ou seja, a atividade abrange as 3 dimensões do processo político: a polity (instituições políticas ou estruturas do sistema político), a politics (processos políticos ou de negociação e barganha que ocorrem dentro do sistema político, entre partidos, poderes, burocracia, governo, etc) e a policy (dimensão material e concreta do sistema político, que são os resultados ou os conteúdos das políticas públicas).
A atividade, portanto, envolve inteligência, organização e aconselhamento sobre ações estratégicas para atingir objetivos, mas também inclui monitoramento e interação com agentes públicos e privados.
Nessa perspectiva, como bem assinala Carlos Alberto Cidades (2022), o profissional de RIG é, sobretudo, intérprete da informação. De um lado, identifica como o legislador, o regulador ou o formulador de políticas públicas pretende disciplinar determinada matéria, e, de outro, traduz os efeitos da norma ou política pública sobre a empresa, o movimento social ou cívico, a entidade, o setor ou o segmento afetado pela decisão.
Como regra, o trabalho de relacionamento com os poderes públicos, como ocorre em nível global, é regulado (por autorregulação ou por lei), conforme recomendação da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico), tanto para ampliar a transparência e o controle da atividade, quanto como forma de moderar os poderes do Estado, que, por intermédio das instituições de governo, exerce os seguintes poderes sob a forma de monopólios2:
1) de impor conduta e punir seu descumprimento (poder coercitivo);
2) de fazer leis obrigatórias para todos (poder de legislar); e
3) de instituir e cobrar tributos ou arrecadar compulsoriamente o excedente econômico da sociedade (poder de tributar).
A regulamentação da atividade de relações institucionais e governamentais, também conhecida como atividade de lobby, ao contrário do que dizem os seus detratores, poderá contribuir para o aperfeiçoamento dessa atividade ao exigir transparência e integridade tanto do agente público quanto dos profissionais que atuam na defesa de interesses.
Afinal, em todas as democracias, as pessoas físicas e/ou jurídicas se organizam sob diversas formas para, legitimamente, representar e defender seus interesses perante os poderes constituídos, e para que a mediação e a resolução de conflitos econômicos, políticos e sociais, seja feita com transparência, ética, equidade e sem favorecimento, é fundamental que haja regulação.
Se alguém é contra determinado aspecto do texto, que proponha seu aperfeiçoamento, mas negar a necessidade de regulamentação da atividade não parece, a priori, postura de quem deseja jogar luzes na relação do Estado com a sociedade e o mercado, como recomenda a OCDE.
O texto aprovado pela Câmara dos Deputados, resultante de debate iniciado em 1987, quando da apresentação do primeiro projeto de lei para regulamentar a representação de interesses, e retomado a partir de 2007 com a apresentação do deputado Carlos Zarattini (PL 1.202/07), e que foi impulsionado pela apresentação do projeto de lei do Poder Executivo (PL 4.391/21), não é perfeito.
Este não atende a todas as recomendações da OCDE, mas supre o essencial, ao prever o credenciamento dos lobistas, e submeter a atividade a princípios e regras que contribuirão para maior transparência e integridade da atividade.
Trata-se, portanto, de lei necessária e urgente, para que o lobby possa ser exercido de forma legítima e sujeita ao escrutínio público. Todavia, ainda que o texto aprovado seja bastante superior ao enviado pelo Executivo, esse ainda reclama aperfeiçoamentos, que caberá ao Senado Federal examinar e propor.
(*) Jornalista, analista e consultor político, mestre em Políticas Públicas e Governo pela FGV. Ex-diretor de Documentação do Diap, é autor do livro “RIG em três dimensões: trabalho parlamentar, defesa de interesse perante os poderes públicos e análise política e de conjuntura”, e sócio-diretor das empresas “Consillium Soluções Institucionais e Governamentais” e “Diálogo Institucional Assessoria e Análise de Políticas Públicas”.
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1 Ver Rua e Romanini (2013)
2 Ver Queiroz (2022, p. 11 e 12)