Reflexão sobre o desempenho do governo Lula 3 no Congresso
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- Categoria: Agência DIAP
Comparar o desempenho do governo Lula 3 no Congresso Nacional com seus 2 mandatos anteriores, sem considerar o contexto político, tem sido o esporte preferido de alguns analistas políticos, de setores da mídia comercial e do mercado. Essas comparações permitem avaliação negativa do governo sem expor o viés de oposição e torcida contra da maioria desses atores.
Antônio Augusto de Queiroz*
Foto: Reprodução
As políticas econômicas, regulatórias e, sobretudo, sociais do governo, que requerem recursos orçamentários para custeá-las, incomodam profundamente o establishment do País. Como resultado, muitos preferem jogar lenha na fogueira dos fundamentalistas e da extrema-direita antidemocrática do que fazer crítica contextualizada ao governo.
A maioria das avaliações sobre derrotas do governo no Congresso Nacional desconsidera que essas ocorrem no campo dos costumes, da religião e do desmame de privilégios a setores do mercado e do Parlamento. Em relação aos temas de costume, como direitos reprodutivos, educação sexual e diversidade de gênero, a predominância conservadora no Congresso tem se mostrado desafio constante. No entanto, o governo tem conseguido evitar retrocessos significativos e, em alguns casos, avançar em políticas inclusivas e progressistas.
Diversos setores da sociedade, por razões distintas, são contrários a alguns pontos do programa de governo, incluindo setores de mercado. Esses setores, por meio do populismo digital, criam bolhas para disseminar fake news com o propósito de dominar corações e mentes, especialmente de pessoas com baixa cognitividade, que são facilmente manipuláveis com falsas acusações de que o governo é contra a liberdade, a propriedade e a família, espalhando o medo entre os incautos.
Ignoram que os 2 governos anteriores ao de Lula, para sobreviver politicamente, adotaram as agendas do mercado e entregaram o Orçamento Público às forças conservadoras do Parlamento, que passaram a constituir sua base de apoio, e que o presidente Lula também teve que conviver com aliados do governo anterior e defensores da agenda bolsonarista em postos-chave no Poder Executivo, como o Banco Central do Brasil e agências reguladoras, todos com mandato. Alguns desses aliados boicotaram claramente as políticas governamentais, evitando que a economia voltasse a crescer e gerar emprego e renda em velocidade maior.
Poucos reconhecem que, apesar da correlação de forças desfavorável no Parlamento, não houve derrotas em políticas públicas estruturais na economia e nas questões fiscais. O PIB, o emprego e a renda cresceram, enquanto a inflação e os juros caíram nestes 18 meses do governo Lula.
Esquecem, propositadamente, que o presidente Lula foi eleito numa eleição polarizada contra candidato que disputou no exercício do mandato, usando fake news e abusando dos recursos e da máquina pública. O então presidente perdeu a eleição por pequena margem de votos, mas a máquina bolsonarista, os recursos do chamado “orçamento secreto” e seu discurso radical, apoiado no populismo digital, elegeram grandes bancadas conservadoras no Congresso, inclusive em partidos como o PP, Republicanos, União Brasil e PSD.
É evidente que a composição do atual Congresso é majoritariamente conservadora e contrária à agenda prioritária do governo e da esquerda. Há presença esmagadora dessa visão de mundo em muitos partidos, inclusive alguns com ministérios no governo Lula, como o PP, Republicanos e União Brasil
Num cenário, em que a sociedade é polarizada e fragmentada, e o Congresso Nacional possui mais de uma centena de parlamentares focados em luta política, espalhando fake news em tempo integral e apontando problemas sem apresentar soluções, não há coordenação política capaz de obter vitórias nesses temas mencionados, mesmo que se entregasse todos os ministérios e recursos do Orçamento aos partidos conservadores.
O governo reservou para seu partido todos os cargos do centro de governo — Casa Civil, Secretaria de Relações Institucionais e Secretaria de Comunicação — e todas as lideranças nas casas do Congresso Nacional. Ceder espaço para outros partidos aliados, como feito em outros mandatos, não seria prudente, especialmente colocando aliados de conveniência e potenciais adversários em postos-chave no governo.
O presidente Lula está certo em não ceder às pressões da mídia e do mercado por mais concessões a esses partidos em troca de apoio nesses temas. Mesmo cedendo tudo, não mudaria o pensamento e a visão de mundo da maioria dos parlamentares desses partidos. Se houver necessidade de mudanças, que sejam após a eleição municipal e a sucessão nas casas do Legislativo, para acomodar lideranças políticas que realmente exerçam influência no Congresso, como os futuros ex-presidentes das casas, desde que ajam em harmonia com o governo durante o processo sucessório.
Em 2026, se os indicadores econômicos — inflação, juros, emprego, renda, PIB, etc. —, continuarem positivos para o governo, a tendência é que faça grandes bancadas entre os partidos aliados programáticos, como fez o bolsonarismo na eleição de 2022.
Portanto, não ceder às pressões da mídia e do mercado por mudanças neste momento parece prudente, pois o objetivo real dessas pressões é colocar adversários da agenda governamental no centro do governo.
(*) Jornalista, analista e consultor político, mestre em Políticas Públicas e Governo pela FGV. Sócio-diretor das empresas “Consillium Soluções Institucionais e Governamentais” e “Diálogo Institucional Assessoria e Análise de Políticas Públicas”, foi diretor de Documentação do Diap. É membro do Cdess (Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social Sustentável) da Presidência da República - Conselhão. Publicado orginalmente na revista eletrônica Teoria&Debate.