Análise sobre o funcionamento das sessões da Câmara dos Deputados
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- Categoria: Agência DIAP

Neuriberg Dias*
Os dados referentes à participação dos parlamentares nas sessões deliberativas da Câmara dos Deputados entre 2019 e 2025 revelam uma transformação significativa no funcionamento do Poder Legislativo. Essa mudança foi inicialmente impulsionada pelas restrições impostas pela pandemia de Covid-19 e, posteriormente, mantida por razões tanto políticas quanto administrativas da Casa.
Em 2019, todas as 185 sessões deliberativas ocorreram exclusivamente de forma presencial, em conformidade com o modelo tradicional de funcionamento do Parlamento. A partir de 2020, com a edição da Resolução nº 14/2020, observa-se uma ruptura desse padrão: apenas 20 sessões foram realizadas presencialmente, enquanto 111 passaram a ocorrer de modo virtual, evidenciando o impacto imediato das medidas de distanciamento social. Em 2021, embora não haja registro de sessões presenciais, as modalidades semipresencial (23 sessões) e virtual (124 sessões) ganharam centralidade, consolidando a adaptação tecnológica do Legislativo.
Nos anos subsequentes, mesmo com a superação gradual do contexto pandêmico, a Câmara dos Deputados não retornou integralmente ao modelo presencial. Os dados indicam a manutenção — e, em determinados momentos, a ampliação — do formato semipresencial: 79 sessões em 2022, 99 em 2023 e 63 em 2024. O ano de 2025 marca um ponto de inflexão relevante: pela primeira vez desde 2020, o número de sessões presenciais volta a ser expressivo (61), contudo o regime semipresencial permanece altamente significativo, com 56 sessões — patamar próximo ao das sessões presenciais. Registra-se ainda a realização de uma sessão virtual.
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Sessões deliberativas na Câmara dos Deputados – 2019 a 2025 |
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Ano |
Presencial |
Semipresencial |
Virtual |
Total |
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2019 |
185 |
0 |
0 |
185 |
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2020 |
20 |
0 |
111 |
131 |
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2021 |
0 |
23 |
124 |
147 |
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2022 |
0 |
79 |
29 |
108 |
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2023 |
0 |
99 |
14 |
114 |
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2024 |
0 |
63 |
23 |
86 |
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2025 |
61 |
56 |
1 |
118 |
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Fonte: Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (DIAP), dados obtidos no portal da Câmara dos Deputados. |
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Essa continuidade não é fortuita. Ela decorre da regulamentação estabelecida pelo Ato da Mesa nº 154, de 10 de fevereiro de 2025, que altera o Ato da Mesa nº 123/2020 e disciplina o regime de funcionamento das sessões deliberativas. O referido ato prevê que, durante a vigência da Resolução nº 14/2020, as sessões possam ocorrer em três formatos: presencial, semipresencial e virtual. Embora determine que as sessões realizadas às terças, quartas e quintas-feiras sejam, em regra, presenciais, também estabelece que as sessões das segundas e sextas-feiras adotem o regime semipresencial, permitindo o registro de presença tanto de forma física quanto por meio do aplicativo Infoleg. Ademais, o Presidente da Câmara mantém a prerrogativa de alterar o regime de funcionamento das sessões conforme a necessidade.
Dessa forma, ainda que tenha sido parcialmente restabelecida a obrigatoriedade de sessões deliberativas presenciais ao longo da semana, o modelo semipresencial permanece institucionalizado, incorporado às rotinas da Casa e utilizado de maneira estratégica para viabilizar a deliberação de matérias no plenário da Câmara dos Deputados. É inegável que esse formato apresente vantagens e desvantagens.
De um lado, o regime semipresencial facilita a participação parlamentar em dias tradicionalmente associados a deslocamentos e amplia a capacidade de convocação de sessões, sem impor restrições relevantes à agenda dos deputados. De outro, seus efeitos sobre o funcionamento do Parlamento suscitam reflexões quanto ao processo legislativo e a tomada de decisão.
Ao tornar a presença física facultativa em parcela significativa das sessões deliberativas, a alteração introduzida pelo Ato da Mesa nº 154, que atribui ao Presidente da Câmara à definição do regime de funcionamento das sessões — embora funcional no contexto atual —, concentra poder na Presidência e no Colégio de Líderes. Ao mesmo tempo, por exemplo, reduz a previsibilidade para a atuação parlamentar e do próprio governo e da oposição, que dependem da regularidade do funcionamento do plenário para organizar suas estratégias políticas.
Ao institucionalizar esse padrão, observa-se uma redução ainda mais acentuada da presença física e da participação deliberativa no plenário, inclusive em comparação ao período anterior à pandemia, quando as sessões ocorriam exclusivamente de forma presencial. Com isso, o regime semipresencial deixa de ser uma solução excepcional e emergencial para se consolidar como uma modalidade permanente de funcionamento do processo legislativo na Câmara dos Deputados.
*Jornalista, Analista Político e Diretor de Documentação do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (DIAP)
¹ https://www2.camara.leg.br/legin/int/atomes/2025/atodamesa-154-10-fevereiro-2025-796940-publicacaooriginal-174322-cd-mesa.html
